Qual é o lugar da beleza na vida das brasileiras? Parte II

Beauty Boom – A beleza que chega com o século XX

Beleza e história: através do século XX ícones da beleza ditavam moda e estilo (desconhecida, Marilym Monroe e Cindy Crawford). de lá para cá muita coisa mudou, com tantas regras à época, atualmente a mídia tem ajudado muitas mulheres a buscarem sua beleza original.

Beleza e história: através do século XX ícones da beleza ditavam moda e estilo (desconhecida, Marilym Monroe e Cindy Crawford). De lá para cá muita coisa mudou, com tantas regras à época, atualmente a mídia tem ajudado muitas mulheres a buscarem sua beleza original.

Revisitar nossa história pode ajudar a entender o que faz do Brasil o 2º país em consumo de produtos do gênero. Na segunda parte da matéria publicada primeiramente no portal M de Mulher, da editora Abril, o assunto é a beleza importada pelos meios de comunicação e entretenimento, principalmente o cinema, que ganha máxima popularidade no início do século XX.

Anos 1920 – 1930

O começo do século XX marca a chegada e popularização de tecnologias importantíssimas para entendermos a cultura do Brasil – e do mundo – até os dias de hoje. É o caso do cinema, do rádio e da mídia impressa, por exemplo. “Até então, não estava tão definido um critério de beleza. Mas com o cinema, com a imagem na tela, determinados tipo de beleza começam a se consagrar: as loiras dos filmes norte-americanos, as italianas corpulentas… Tipos mais específicos de corpos e cabelos”, diz Del Priore.

Com a urbanização e industrialização a todo vapor no Brasil dessa época, cresce também o número de produtos de beleza – e de seus anúncios “encantadores” nas revistas, cada vez mais numerosas e populares. “Promessas de peito duro com uma pomada que se passasse, produtos para clarear a pele… A praia também entra na moda nessa época: era considerado saudável, um prazer hedonista. Mas a mulher não podia passar mais de 10, 15 minutos nadando: a ideia era continuar com a pele branca – o que também se articula com o racismo”, pontua Mary.

Antes da chegada desses novos modelos de beleza, as negras, aliás, tinham sua beleza mais valorizada. De acordo com a especialista, elas usavam seus corpos e cabelos como uma “tela de pintura”. “Os viajantes sempre destacaram a beleza da mulher negra. Ela usa seu corpo mesmo sem vestes caras, no século XVIII. Usa marcas no seu corpo. Seus cabelos eram sempre penteados com coisas incríveis”. Como a chegada da mídia trouxe força à beleza eurocêntrica da mulher branca, as negras ficaram de fora desse padrão.

Nas revistas, por conta das mulheres estarem no mercado de trabalho, começam a aparecer dicas de como se vestir sem meramente “copiar” o estilo das estrelas de cinema. Não seria apropriado, afinal, um provocador vestido vermelho para ir ao escritório. “As revistas vão orientar como se vestir: é como um código de conduta”, situa Del Priore.

Anos 1950

Com a popularização da TV, o cinema perde um pouco de sua força – e enquanto as “imagens nas telas” se ampliam, elas também se tornam cada vez mais importantes para o estabelecimento de padrões. Segundo a historiadora, é aí que eles começam a ficar mais e mais homogêneos. Com o que ela chama de “bombardeio” das telenovelas, vai se formando uma “galeria de tipos que vão ser perseguidos como bonitos”. Até hoje, esses tipos envolvem principalmente loiras “falsas”, com cabelos tingidos – que, apesar da plataforma diferente, ainda trazem muito das estrelas de Hollywood.

É justamente nesse momento histórico, aliás, que surge tanto o concurso Miss Universo, em 1952, quanto o Miss Brasil, em 1954.

Anos 1960, 1970

Nessa época, chegam ao mercado três produtos essenciais para a compreensão do que sustenta os padrões de beleza: a boneca Barbie, as academias de ginástica e os canais de venda, ao estilo Polishop. Juntas, essas três novidades conseguem padronizar ainda mais o corpo da mulher brasileira, que passa a querer ter peito grande e a querer (ainda mais que antes!) ser loira. “Nessa época, chega tudo o que a mulher precisaria para conseguir se parecer com a Barbie – inclusive, mais adiante, a democratização da cirurgia plástica”, conta Del Priore. A padronização, com isso, vai ficando cada vez mais forte, palpável e presente no mundo real.

Ao mesmo tempo, ocorre nessa década uma “explosão da juventude”, como chama a historiadora. O movimento hippie, o feminismo e, acima de tudo, a pílula anticoncepcional mudam completamente a realidade e as possibilidades contempladas pelas mulheres da época – e não só no âmbito sexual. A chegada da pílula muda também o padrão de beleza: se antes a gordura chegou a ser sinônimo de formosura e a magreza, de doença, agora, por conta dos hormônios sintéticos, o corpo feminino não é mais o mesmo. Os quadris e os corpos como um todo diminuem de proporção. As musas do cinema acompanham as mudanças: “A mulher de terninho executivo, no cinema americano, ‘vai à luta de terninho': a pílula já mudou o corpo dela também”, relembra a especialista.

De volta para o futuro – E o século XXI?

Se até agora foi a chegada de imagens às telas a maior influência na nossa forma de ver o belo (ou, mais especificamente, a bela), a multiplicação frenética de imagens que vem com o novo século possibilita, a passos lentos, uma ampliação no espectro daquilo que consideramos bonito. Depois do surgimento da internet e das redes sociais, qualquer um consegue compartilhar com o mundo sua imagem.

Antes, ficava fora do alcance do público a escolha das imagens da “beleza” veiculadas pelo cinema, pela TV e pela imprensa. Hoje, isso não acontece mais: qualquer um com acesso à internet pode ver e ouvir pessoas do mundo todo. Apesar de o cenário ainda não ser ideal, ele com certeza ajuda a perceber que os padrões preestabelecidos não são, digamos, tão interessantes quanto um dia já pareceram ser.

Em meio a esse novo contexto, surge também uma nova onda do feminismo – o que nos faz questionar os padrões com ainda mais força. Até mesmo os concursos de Miss estão sentindo, aos poucos, o baque destas mudanças – se em mais de 60 anos de existência, por exemplo, só quatro negras foram coroadas Miss Universo e só uma foi Miss Brasil, as coisas parecem estar mudando. Em 2016, seis das 27 finalistas do Miss Brasil são negras: Vitoria Esteves (Bahia), Beatriz Leite (Espírito Santo), Deise  D’Anne (Maranhão), Raissa Santana (Paraná), Maria Theol Denny (Rondônia) e Sabrina Paiva (São Paulo). Aliás, a Miss Estados Unidos 2016 também é negra – o que mostra que, aos poucos, começamos a ver mais diversidade das belezas nos concursos.

Diante das mudanças mais recentes e da história do país como um todo, tudo que podemos esperar é que essa flexibilização contemple cada vez mais os tipos diferentes de beleza, levando cada vez mais em consideração as variações de cor, peso e cabelo das mulheres – participem elas de concursos ou estejam ao nosso redor, na vida cotidiana. Fora isso, quem sabe com essa multiplicação das imagens seja também possível questionarmos (e aí já é outra história): para que a mulher precisa da beleza? Será que ela precisa mesmo?

Fonte:
https://goo.gl/DFVLKH

Esta matéria foi publicada primeiro no site M de Mulher da Abril Editora.

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